sábado, 21 de março de 2009

Dores de crescimento

Houve um tempo em que te achei impregnado em mim. Impregnado, uma coisa que levava na pele, que carregava para trás e para a frente. Transpiravas-me nos poros, saías-me nos restos de fôlego depois de correr, pairavas no ar depois de cada passa no cigarro. Eras como uma nódoa dessas entranhadas que não saem nem com esfregão de arame. Uma marca de nascença. Um sinal.

Hoje acho-te só uma dor de crescimento. Daquelas que te fazem fechar os olhos e apertar a cabeça com força. Das que ficam ali, a moer, numa dor fininha e persistente até desaparecerem.

E eu precisei de 696 dias e 22 horas para que tu desaparecesses de dentro de mim.

Para que deixasse de doer cá dentro, para que, volta meia volta, não regressasses em forma de dor aguda. Para te arrancar a ferros, para me lavar por dentro e aprender a respirar sem ti. (E isso que sempre foi difícil respirar contigo. Esse nó cá dentro, esse peso no peito.)

"-Voltas?"
"-Diz-me que voltas..."

Precisei de 696 dias. Contados no calendário, entrapados em lágrimas, escorridos em horas de angústia e de raiva. De dentes cerrados até doer. E finalmente livre. Finalmente sem ti. Finalmente o olhar-te nos olhos e já não está. Foi-se a dor fininha. Foste-te.

22horas. Para pensar em como apagar as marcas. Para suspirar por última vez, deitando fora o último sopro de ti.

Precisei de te ter, de te sentir e perder e recuperar e deixar ir e afastar-te e odiar-te... tanto, tanto, tanto! Com tanta força e de olhos tão fechados numa tentativa inútil. E outra vez a cair e a dizer que desta é que é, desta é que vai ser o certo e a esquecer que eras um erro. O meu erro, o maior erro... (mas porquê tão certo?)... A minha maior verdade. Dessas que batem de frente. Cruas e definitivas.

Precisei de 696 dias e 22 horas para crescer. Para te fechar a porta e deixar ir sem olhar para trás. Mas tu tens de ganhar sempre, não é?

"-Eu jogo muito bem e não gosto de perder."

E por isso foste, mas levaste contigo o que eu fui antes de te conhecer. Por isso volta. Diz-me que voltas. Não que voltas para mim. Mas que voltas. Só para me devolveres o que eu fui. E depois podes ir. Não fiques. Eu não quero que fiques.

1 comentário:

  1. Li quase todos os teus textos, à excepção dos escritos em espanhol! :) Este é o mais bonito, o mais transparente, o mais tu. Por que será? :)

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